EM GANGTEY, COMO ANTIGAMENTE


Alguns lugares sugerem uma volta no tempo. É como se a vida passasse bem devagar. Ritmo lento. Simplicidade. Cenário intocado. Contato com a essência. Gangety é assim. Um pequeno povoado no centro do Butão que vive sem pensar em modernidades. Pouquíssimos carros. Praticamente não tem comércio. O telefone não funciona de jeito nenhum. A internet quase não pega, às vezes entra um leve sinal da Mongólia que logo desaparece. As plantações são todas feitas manualmente, nenhuma máquina à vista. E a vida passa lentamente, sem estresse. Entre uma caminhada e outra pelas aldeias, nos verdes campos ouve-se ao longe o canto do black-necked crane, pássaro migratório que vem do Tibet, e adora descansar por aquelas bandas. Boa escolha das aves. Sossego é ali mesmo.


Gangtey convida à muitas caminhadas pelas matas e pelos campos.


O burrico ajuda já que carros são artigo de luxo por ali.

PARA CHEGAR AO PARQUE NACIONAL BLACK MOUNTAINS

O caminho de Thimphu (capital do Butão) à Gangtey (que fica num vale no parque Nacional Black Mountains) é de mais ou menos 140 quilômetros e leva em torno de 4 horas. A estrada é muito estreita, sinuosa e pendurada nas montanhas. Alguns trechos são bem esburacados e até desmoronados devido à estação chuvosa. Praticamente passa um carro de cada vez. Caminhões coloridos e enfeitados são uma constante. E, eles andam relativamente rápido para as condições da estrada. Dá para ficar um pouco tenso. Bandos de macacos de várias espécies atravessam a pista vez ou outra. Curiosos ficam olhando o carro passar e nem se incomodam. Iaques pastam por ali com frequência. Esse animal é um bovino enorme, de pelagem longa, típico do Himalaia. Parecem búfalos peludos. Podem ser selvagens ou domesticados. Os butaneses consomem a carne do animal e usam o leite para beber e fazer queijo. Se der sorte, leopardos e ursos também podem aparecer ao longo da viagem.

Na estrada caminhões coloridos, macacos de várias espécies e iaques.


Parque Nacional Black Mountains, com montanhas de até 5 mil metros.

Vale Probjikha.

VALE PROBJIKHA

No belíssimo Vale Probjikha, a maior cidadela é Gangtey. Não chega a ser uma cidade, mas uma aldeia budista rural. Não fosse o Monastério Gangtey Goemba e o hotel Amankora Gangtey, o vale seria visitado apenas pelas aves migratórias. Como a rede Amankora sempre procura lugares bucólicos para construir seus hotéis, essa região que é parte do Parque Nacional Black Mountais e considerada santuário ecológico foi escolhida. E, muito bem escolhida.

Vale de Probjikha, no Parque Nacional Black Mountains.

As casas são espalhadas pelo Vale Probjikha e as estradas são todas de terra.


Algumas casas mais imponentes aparecem vez ou outra pelo vale.

Ali é possível sentir a essência do Butão. Entrar em contato com pessoas que nunca saíram daqueles campos para ver o que há além das altas montanhas. A cultura ainda não sofreu nenhuma interferência do mundo exterior. É comovente ver o modo singelo e feliz com que vivem as famílias. 

Mulheres butaneses colhem rabanetes.


Cestas de palha são usadas para transportar o que colhem nos campos.

Eles trabalham sempre em mutirão. Todos se ajudam. Não há o conceito de privacidade. Uns participam das vidas dos outros livremente. Seja para plantar, construir uma casa, arrumar uma estrada, ou educar os filhos. Além disso, todos são iguais independentemente do sexo. Se é para carregar pedras, para construir uma estrada ou o que for. Homens e mulheres trabalham lado a lado. 

Homens e mulheres trabalham nas mesmas condições. Todos têm direitos iguais.

GANGTEY

Por ali pouca gente se aventura. O pequeno vilarejo tem praticamente uma rua. Nessa rua, um mercadinho muito simples e duas lojinhas (se é que dá para chamar de loja) vendem roupas e objetos usados. É um lugar perfeito para garimpar peças antigas. O preço é dado conforme a cara do freguês.

E, no final da ladeira, o ponto alto da visita: o antigo monastério Gangtey Goemba.

O vilarejo vive em função do monastério desde o século XVII. As famílias que moram ali auxiliam na manutenção e funcionamento da escola dos pequenos monges budistas. 

O vilarejo de Gangtey, e no alto o belíssimo monastério.


Butanês em uma pequena tenda vendendo objetos usados.


A mulher vende roupas femininas - Kira - usadas. Os tecidos são lindos. Feitos em tear manual.


Vovó butanesa com o neto e monges passeiam pelo vilarejo.

GANGTEY GOEMBA

O monastério é um dos mais antigos e tradicionais do Butão. Foi construído em 1613 por um neto do Guru Rinpoche, figura importantíssima na introdução do budismo no país. Inicialmente, era bem pequeno. Foi construído como um templo com a ajuda dos moradores do local. Mais tarde foi reformado e ganhou seu formato atual como um forte. Em 2002 foi novamente remodelado pelo quarto rei do Butão.

Monges no portão de entrada do monastério. Ao fundo, o vilarejo de Gangtey.


Gangtey Goemba.


As pinturas do monastério são muito coloridas e delicadas.

O complexo é formado por cinco prédios ao redor de um templo central, com arquitetura tibetana. Cento e vinte meninos, com idades que variam entre 6 e 18 anos moram no monastério e recebem educação para ser monges. As famílias devem optar pelo início da vida religiosa dos filhos até os seis anos. Se o menino, mais tarde, decidir que não quer continuar por esse caminho é preciso pagar uma multa. Para as famílias mais humildes, enviar os filhos cedo para receber os ensinamentos budistas significa garantir um futuro digno. No momento, segundo eles há cinco monges reencarnados. Um deles é tratado com bastante regalia por ser a reencarnação de um lama importante.

Monges em Gangtey Goemba.

Para auxiliar na manutenção do monastério e garantir o sustento dos meninos, eles aceitam a contribuição dos turistas que visitam a região. Por um valor de U$ 150 dólares pode-se acompanhar o almoço dos pequenos monges.

Refeitório dos monges.

Sentados no chão do refeitório, eles aguardam em silêncio com seus pratinhos na mão. Alguns não usam pratos e estendem guardanapos para receber seu alimento. Eles comem basicamente arroz com legumes. Muitos comem com as mãos. Outros têm colheres. Eles não comem por prazer, mas para alimentar o corpo e garantir energia para as orações.

Alguns monges comem com as mãos, outros nem prato tem (como o menino da direita que tem seu arroz embrulhado num guardanapo).

Visitar o monastério e dividir o momento do almoço com os monges é muito especial. Toda a tensão da estrada de quase 5 horas se justifica depois dessa experiência.

CAMINHANDO PELO VALE

Carros circulam em poucos locais do vale. A maior parte dos trajetos interessantes deve ser feita a pé. Por isso, é fundamental escolher uma época que não seja nem chuvosa nem quente demais. Novembro é perfeito. Afinal, caminhar é preciso. E, bastante. O carro vai do hotel Amankora até o centro de observação dos pássaros migratórios Black-necked crane, onde é feita a contagem diária do número de aves chegando para se reproduzir. Dali ainda dá para ir mais um pequeno trecho de carro até as proximidades de outro monastério, o Khewang. Depois, só andando.


Monastério de Khewang.

Essa trilha leva entre 3 e 5 horas dependendo do que se quer ver. No caminho estupas, vilarejos, subidas íngremes por dentro da floresta, plantações de beterrabas e batatas, córregos e por fim Gangtey Goemba. É muito bonito. Vale o esforço. Para retornar do monastério até o hotel dá para voltar de carro ou andando. Só depende da disposição de cada um.

Centro de observação do black necked-crane.

Cada curva do caminho tem uma lenda. E o guia vai caminhando e contando histórias...

Mais à frente uma estupa bem "rural"

Depois é a vez de atravessar o córrego por uma ponte perfeita para testar o equilíbrio.

E, finalmente, depois de subir os 500 metros mais íngremes do Butão... lá está o monastério.

BANDEIRAS DE ORAÇÃO

Por onde quer que se vá, lá estão elas, as bandeiras de oração. São por vezes brancas outras vezes coloridas. Algumas pequenas, outras enormes. Pode haver uma solitária ou um conjunto de 108. Cada uma tem seu significado. Alegria, tristeza, sorte, nascimento, morte... Elas são uma tradição do budismo tibetano. Dizem que Buda recitou uma prece e ela foi impressa numa bandeira durante uma batalha entre dois povos. A paz foi logo celebrada entre eles e desde então, as bandeiras são penduradas ao ar livre para espalhar energia positiva. As bandeiras costumam ter mantras e desenhos impressos. Ao entrarem em contato com o vento espalham paz e benefícios para a humanidade. 

As bandeiras de oração estão sempre presentes no Butão, especialmente no alto das montanhas e vales.


As azuis representam a água, brancas o céu e as nuvens, vermelhas são fogo, as verdes representam a natureza e as amarelas a terra. 

As que mais chamam atenção são os conjuntos de 108 bandeiras brancas penduradas no topo de 108 estacas altas feitas de bambu. Elas são hasteadas em homenagens às pessoa queridas que faleceram. Nas cidades quase não se vê mais. Mas, nas áreas rurais ainda são muito comuns.

Grupo de 108 bandeiras brancas de oração em homenagem aos mortos.

HOTEL AMANKORA GANGTEY

Amankora Gangtey é ainda menor do que o de Thimphu, são apenas 8 quartos. Interessante que os quartos são exatamente iguais aos do Amankora Thimphu. Parece que você continua no mesmo hotel. Ao entrar no quarto, as malas já estão arrumadas como no hotel anterior. A sensação é de total familiaridade. Muito interessante para quem fica dois dias em cada cidade. 

O visual do hotel é espetacular. Tomar o café da manhã na varanda é perfeito. 

Um café da manhã especial no Amankora Gangtey.

O hotel é rústico. Bem integrado com o lado mais rural do Butão

Funcionárias do hotel vestindo o traje nacional, Kira

MAIS ALGUMAS INFORMAÇÕES

ALTITUDE DE GANGTEY: 3.000 metros

HOTEL: Amankora Gangtey

INTERNET: quase não funciona, o sinal vem da Mongólia.

TELEFONE: as companhias telefônicas brasileiras não funcionam no Butão. Só se consegue falar via Skipe, quando entra o sinal.

RESTAURANTES: as refeições estão incluídas na diária do hotel, mas eles indicam dois restaurantes nas redondezas para quem quiser experimentar a culinária local.

O QUE FAZER: trilhas pelos vilarejos, visitar monastérios, conhecer o observatório das aves migratórias tibetanas black-necked crane, almoçar com os monges, curtir o charme do hotel.

LEIA TAMBÉM:



E antes de partir para Punakha mais uma cerimônia de purificação.

Na próxima semana o relato sobre Punakha.

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COMENTÁRIOS

  1. Nossa Cláudia,nos sentimos em Gangtey. Que ótimo esse post. E que experiência de estar nesse lugar perdido no tempoe no espaço.

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  2. Hello Claudia

    It's a pleasure to see all these wonderful pictures on your blog...... you have visit so many nice places and meet a lot of nice people.

    Thanks for this great post.

    Greetings from the Netherlands.

    Joop

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  3. Claudia
    Que paz!!!!
    adorei
    obrigado
    abs
    VS

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  4. Marina,

    Super experiência. Amei essa viagem!!!!!

    Beijos

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  5. Joop,

    Thanks a lot for your commments.

    I love to travel and specially to exotic places. Meet people is part of the trip.

    Greetings from Jamaica.

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  6. VS

    Paz é no Butão mesmo. Em todos os sentidos.
    A espiritualidade deles contagia.

    Claudia

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  7. Cláudia,

    A quarta linha deixou-me meio confuso. Você diz que há um fraco sinal de internet vindo da Mongôlia. É que a Mongôlia fica muito distante do Butão... Ter-se-ia de atravessar a china de sul a norte para se sair do Butão à Mongôlia. Acho que você se terá enganado no nome do país. Não terá querido se referir a um outro país mais próximo?

    Isaac

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  8. Isaac,

    É isso mesmo. O hotel Amankora de Gangtey só consegue receber sinal de internet da Mongólia. O sinal é péssimo e entram mensagens dizendo que a conexão não é segura. Dá uma certa insegurança de usar. Os avisos dizem que sua conta pode ser "rackeada". O gerente do hotel avisa que isso vai acontecer e diz que não é para se preocupar. Bem estranho!

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  9. Com estas fotos e suas descrições, fiquei completamente rendida. Fiquei com uma imensa vontade de me sentir num ambiente muito menos humanizado, mais natural e fantasticamente bem conservado, preservando as tradições.

    A sua viagem foi absolutamente deslumbrante...

    Beijinhos

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  10. Oi Turista,

    A cultura local está (ainda) muito bem preservada. O país é um encanto. Eles costumam dizer que é a Suiça do Himalaia.

    Vale uma viagem com certeza. E os hotéis Amankora são excelentes.

    Beijo

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  11. Lindas fotos! Adorei a matéria!!!

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  12. Estamos rendidos ao Butão! É mesmo como regressar atras no tempo!
    Bjs

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  13. it's a pleasure for my eyes, thank you a nice post

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  14. Casal,

    Tenho certeza de que essa viagem tem muito a ver com o perfil de vocês.

    Bj

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  15. Claudia

    Fotos incríveis como sempre!
    Deu-me um arrepio quando vi as crianças-monges descalças comendo naquelas condições...pensei no meu filho...
    Os hoteis de luxo não condizem muito com a pobreza do país...

    Beijos

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  16. É, Margarida

    Há muita pobreza no Butão. Mas, eles têm outro modo de ver a vida. O choque é grande para nós ocidentais. No entanto, eles vivem muito felizes apesar das condições. Nos lugares mais rurais, os filhos são criados não só pelas mães e pais mas pela comunidade. Nos mosteiros, eles seguem essa linha. Não há o conceito de privacidade. É duro ver esses pequenos passando frio com os pés descalços. Eu dei meu gorro e meu cachecol.

    Para os budistas a comida só importa como alimento para a alma. Não é associada ao prazer. Tudo é muito diferente. Essas diferenças culturais, por um lado podem ser chocantes, mas por outro fazem a gente repensar alguns conceitos. Eu aprendo muito quando viajo. O mundo é uma escola.

    Bj

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  17. Oi Claudia, sempre na carona das suas dicas. Vou no próximo mês para o Butão e gostaria de saber se há restrições sobre entrada de medicamentos.
    Obrigada.

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  18. Elizabeth,

    Imagino que não. Eu costumo viajar sempre com algumas vitaminas na mala. Ninguém olhou nada na chegada. O aeroporto é mínimo e bem tranquilo. O que não pode é cigarro. Eles travam mesmo. Tem uma política bem dura com tabaco.

    Depois conta como foi. Pouca gente vai ao Butão. São poucos os relatos sobre o país.

    Bj

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  19. Querida Claudia

    Vc pode até ter razão, mas depois de ler o seu post senti-me grata a Deus por não me ter deixado nascer no Butão...rsrs

    Já agora conta para mim como é que vc consegue aparecer assim tão arrumada nas fotos das viagens?? Eu fico quase sempre horrível, toda descabelada...hehe...tenho sempre grande dificuldade em escolher uma fotinha que me favoreça...
    Beijos!

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  20. Ah, Margarida!

    Cada um nasce no lugar certo. hehehe Você nunca nasceria no Butão, Índia, Sri Lanka, Nepal, Cambodja, Laos, Vietnan.... Acho que nasceria na Inglaterra, Escócia, Áustria, quem sabe nos Estados Unidos ou Canadá, Alemanha talvez, quem sabe Itália e certamente em Portugal. Olha meu abuso!!! rsrs

    Eu por exemplo não gostaria de morar num lugar excessivamente frio, apesar de adorar uma semaninha de neve por ano. Só uma!!!

    E ficaria louca se tivesse nascido em um país muçulmano.hehe

    Beijinho


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  21. Claudinha

    Acho que tem razão...hehe...e quanto á sua última frase estamos completamente de acordo!!!Nem me fale...

    De qualquer modo acho que vc arrasaria sempre, mesmo nascendo em qualquer lugar do mundo...rsrs...é a viajante-blogueira mais elegante da Blogosfera!Está sempre perfeita seja em que lugar fôr e em qualquer circunstância... ;-)

    Beijinhos

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  22. Margarida,

    Só você mesmo!!!

    Obrigada pelos elogios. hehehe

    Bjs

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  23. Estão belíssimas as tuas fotos - e tu estás uma encantadora menina quando nelas aparece. Fantástica viagem.Bjs

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  24. Oi, linda!
    Você arrasa em todas as postagens.
    Que lugar - o que dizer? Tudo muito lindo! Beijo

    saudades também

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  25. Ilaine,

    Que bom ver você por aqui. Senti sua falta.

    Beijos

    Claudia

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  26. Cláudia,

    Excelente seu blog sobre o Butão. Parabéns mesmo. Ajuda muito quem quer viajar para lá.

    Uma coisa que me chamou a atenção foi o preço que vc mencionou que se paga para ver os pequenos monges se alimentarem. São 150 dolares mesmo? Vc não se equivocou no valor?

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  27. Cláudia,

    Excelente seu blog sobre o Butão. Parabéns mesmo. Ajuda muito quem quer viajar para lá.

    Uma coisa que me chamou a atenção foi o preço que vc mencionou que se paga para ver os pequenos monges se alimentarem. São 150 dolares mesmo? Vc não se equivocou no valor?

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  28. Claudio,

    Não sei se você achou alto ou baixo o valor.

    Mas, esse valor é dado para ajudar na alimentação dos meninos. O dinheiro serve para comprar mantimentos e artigos de primeira necessidade para os monges.

    Vale cada centavo. É uma experiência maravilhosa.

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